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Renovação da Câmara tende a ser menor em 2022

Antônio Augusto de Queiroz*

A eleição para a Câmara dos Deputados, depois da janela para mudança de partido, do prazo de filiação para participar do pleito e da criação de federações partidárias, será influenciada:

1) pelo ambiente político;

2) pela vinculação dos candidatos congressuais às candidaturas presidenciais competitivas; e

3) pelas mudanças na legislação eleitoral e partidária.

Todos esses fatores favorecem os candidatos à reeleição, o que sinaliza renovação, em relação à composição total da Câmara dos Deputados, um pouco menor que a média histórica de 47%.

Ambiente político
O primeiro fator, o ambiente político, embora seja de renovação para a eleição presidencial, não está tão pressionado por mudanças no Congresso Nacional como ocorreu em 2018.

Naquela eleição, além da existência de sentimento antissistema e de forte apelo por renovação, havia enorme percepção de degradação moral e corrupção generalizada, por força da Lava-Jato, o que favorecia maior renovação.

Vinculação à candidatura presidencial competitiva
O segundo fator, a vinculação à candidatura presidencial competitiva, será importante para todos os postulantes ao Congresso, especialmente para os candidatos à reeleição.

Os partidos dos principais competidores na eleição presidencial costumam fazer as maiores bancadas, como ocorreu com o PSL e o PT em 2018, por exemplo. E nestas eleições, muito polarizadas entre Lula e Bolsonaro, esse aspecto terá apelo ainda maior, já que os candidatos do PT e do PL irão pedir votos para os candidatos ao Congresso Nacional de seus partidos, inclusive como forma de assegurar governabilidade na hipótese de sucesso.

Mudanças eleitorais e partidárias
O terceiro fator, as mudanças eleitorais e partidárias, também favorece os candidatos à reeleição para a Câmara dos Deputados, especialmente a exigência de votação mínima para participar do sistema de sobras1, 1 dos 4 critérios de conversão de votos em mandatos.

Os candidatos à reeleição tendem a ser os mais votados em seus partidos e certamente atingirão facilmente, de forma individual, os 20% do quociente eleitoral2, dependendo apenas de que seus partidos alcancem o quociente eleitoral ou façam 80% desse e alcancem a maior média, as 2 outras exigências para a conversão de votos em mandatos no sistema de sobras.

Em reforço ao bom desempenho individual dos atuais deputados candidatos à reeleição, registre-se que as vantagens comparativas deles em relação aos novos postulantes ou aqueles que não estão no exercício de mandato são enormes, considerando os custos de campanha e a dificuldade deles quanto ao acesso aos meios de comunicação e às bases eleitorais, que já estão consolidadas por quem exerce o mandato.

O candidato à reeleição, que disputa o pleito no exercício do mandato, além do nome já conhecido e de relação de serviços prestados às suas bases eleitorais, tem a seu favor cabos eleitorais fidelizados — muitos dos quais contratados nos seus próprios gabinetes —, e estrutura ou máquina decorrente do cargo que ocupa.

A título de exemplo, podemos apontar, entre as vantagens de deputado federal candidato à reeleição, as seguintes:

1ª) emendas individuais, cujo valor anual supera R$ 16,3 milhões (valores para 2021);

2ª) quota ou verba de gabinete entre R$ 30 mil e R$ 44.320,46 por mês para despesas diversas do mandato, como passagens aéreas, telefonia e material de expediente, consultoria, hospedagem, impressão de material, combustível, locação de veículos e aluguéis de escritórios políticos etc.;

3ª) verba de R$ 111.675.59 mensais para a contratação de 5 a 25 secretários parlamentares no gabinete e no estado de origem do parlamentar;

4ª) garantia de prioridade na destinação para a campanha dos recursos do fundo eleitoral; e

5ª) poder, prestígio e acesso aos veículos de comunicação, muitas vezes por interesse dos próprios veículos em manter boa relação com os detentores de mandatos. Se o candidato for de situação ou da base de apoio do governo, ainda conta com as verbas das emendas do relator, diferencial importante na disputa para renovação do mandato.

Portanto, os candidatos à reeleição neste pleito só não renovarão os mandatos se os partidos não atingirem o quociente eleitoral ou não forem contemplados com o sistema de sobras. Assim, o eventual insucesso de candidatos à reeleição será muito mais decorrente do baixo desempenho de seus partidos, especialmente os pequenos e médios, que terão dificuldades em atingir 100% ou 80% do quociente eleitoral — condição indispensável para eleger representantes — do que propriamente do desempenho individual desses candidatos.

Sistema de sobras
Para se ter uma ideia da dimensão da mudança no sistema de sobras, basta dizer que em 2018, quando ainda havia a possibilidade de coligação na eleição proporcional e não havia exigência de votação mínima dos partidos (exigia-se apenas a maior média e a existência de candidatos com votação igual ou superior a 10% do quociente eleitoral), 249 das 513 vagas da Câmara dos Deputados foram ocupadas por esse sistema.

Em 2022, por força da proibição de coligação na eleição proporcional, certamente haverá aumento do número de vagas a serem distribuídas por esse sistema e muitos partidos, por não terem atingido o percentual mínimo de votos em alguns estados, estarão fora dessa distribuição. Esse arranjo tende a favorecer os grandes partidos, os partidos organizados em federação ou os partidos com grandes puxadores de voto.

Entre os fatores que, combinado com o fim das coligações nas eleições proporcionais, irão favorecer os grandes e prejudicar os pequenos partidos podemos citar, de um lado, o aumento de 1,5% (em 2018) para 2% do percentual de votos nacionais para atingir a cláusula de barreira (em 2022), e, de outro, a redução da quantidade de candidatos por partido, o que reduz a capacidade desses pequenos partidos de somarem votos para efeito de atingir o quociente eleitoral ou de 80% desse quociente.

Renovação na Câmara dos Deputados
Quanto à renovação na Câmara dos Deputados, registre-se que, de acordo com estudo do DIAP3, pelo menos 20% dos ocupantes de mandato na Casa desistem da reeleição, seja porque disputam outros cargos, seja porque resolvem não concorrer a nenhum cargo. Assim, só por esse fenômeno (o fato de que apenas algo como 80% dos deputados disputam a reeleição) já haveria renovação automática superior a 20%.

Além disso, de acordo com a mesma fonte, a média de recondução dos que efetivamente concorreram à reeleição, de acordo com as últimas 8 eleições proporcionais, foi da ordem de 62%. Logo na Câmara dos Deputados, tendo como referência esses dados do DIAP, a média de renovação (e a mediana não é muito diferente) em relação ao total dos parlamentares foi de 47%, e, em relação aos que efetivamente concorreram à reeleição, 38%.

No pleito de 2022, portanto, mesmo com as grandes migrações na janela partidária e com as novas regras eleitorais e partidárias, o número de desistências não deve variar muito e o índice de renovação tende a ser um pouco menor que a média e também a mediana histórica.

O que pode mudar significativamente não será a quantidade de candidatos à reeleição nem mesmo o índice de renovação, mas a composição das bancadas partidárias, com prejuízo para os pequenos e médios partidos, que terão dificuldades em atender aos novos requisitos da legislação eleitoral e partidária.

Porém, independentemente do índice de renovação da Câmara dos Deputados, o fato é que o futuro presidente da República, seja quem for o eleito, terá grande desafio na relação com o Congresso Nacional, de um lado porque precisa assegurar governabilidade, já que dificilmente terá maioria em seu partido ou coligação, e, de outro, porque precisa impor freios ao avanço dos partidos sobre o orçamento público, que foi apropriado pelo Parlamento, especialmente pelo Centrão.

Há 2 outras tendências que estão postas: a primeira será leve crescimento da esquerda na Câmara dos Deputados e a segunda será a disputa entre o PT e o PL pela condição de maior bancada em 2023, por serem os partidos dos 2 principais candidatos à Presidência da República.

(*) Jornalista, mestre em Políticas Públicas e Governo (FGV), consultor e analista político em Brasília. Ex-diretor de Documentação do Diap. Atualmente é sócio das empresas “Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”. Publicado, originalmente, na revista eletrônica Teoria&Debate
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1 A legislação estabeleceu quatro critérios para conversão de votos em mandatos proporcionais: 1) o primeiro critério requer atingimento do quociente e 10% desse quociente pelos candidatos; 2) o segundo exige maior média e atingimento de 80% do quociente pelos partidos ou federações, além de 20% desse quociente pelos candidatos; 3) o terceiro critério requer maior média e 80% do quociente dos partidos e federações, sufragando os mais votados sem exigência de votação mínima; e 4) o quarto critério, que somente se aplica quando nenhum partido ou federação do estado tiver atingido o quociente eleitoral, distribui todas as vagas entre os candidatos mais votados, independentemente de partido ou federação, sem qualquer outra exigência.

2 O quociente eleitoral corresponde ao resultado da divisão do total de votos válidos pela quantidade de cadeiras que cada Estado possui na Câmara dos Deputados

3 https://www.diap.org.br/index.php/publicacoes?task=download.send&id=962&catid=13&m=0. Radiografia do novo Congresso – legislatura 2019-2013, p. 27 (tópico 2.6 – histórico de reeleição na Câmara dos Deputados)

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