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JOANAS – Peça baseada em “Gota d’Água”, de Chico Buarque e Paulo Pontes, marca estreia do Núcleo de Teatro do Sisejufe em espetáculo virtual

“O fundamental é que a vida brasileira possa, novamente, ser devolvida, nos palcos, ao público brasileiro. Esta é a segunda preocupação de Gota d’Água. Nossa tragédia é uma tragédia da vida brasileira.” Registro dos autores no prefácio do livro, de 1975

Na noite de quarta-feira, 17 de novembro, o Núcleo de Teatro do Sisejufe fez a sua primeira apresentação virtual da peça “Joanas”, após sete meses de ensaios semanais. O título escolhido para o espetáculo faz referência à protagonista da obra “Gota d’Água” de Chico Buarque e Paulo Pontes, escrita e publicada em 1975, na qual o espetáculo virtual foi baseado. A peça foi ensaiada e conduzida pelo professor do curso, o ator e diretor André Arteche – que começou ainda menino no cinema e tem vários trabalhos no teatro e em diversos segmentos de televisão como séries, novelas e minisséries. Arteche fez a adaptação da peça para o formato de videoconferência digital, com duração aproximada de 30 minutos, em conjunto com diretora-assistente Laura da Rosa.

O elenco formado por servidores sindicalizados da ativa e aposentados teve a participação de Amauri Pinheiro como Mestre Egeu – um personagem-narrador, que dá andamento à história. Mara Papparela é a que começa interpretando Joana, a rotagonista – inspirada em Medeia, do grego Eurípides. Aliás, uma lembrança desse clássico da dramaturgia brasileira é a maneira como Chico e Pontes brincam, entremeiam e transitam entre as tão iguais e, no entanto, diferentes crenças que pode ser sintetizada, dentre tantas frases, em “Conto com a Virgem e o Padre Eterno, Todos os Santos, Anjos do Céu e do Inferno, eu conto com todos os Orixás do Olimpo”.

Carla Nascimento, interpreta uma das comadres. Luiza D’Alessandri e Érika Ramos, outras faces de Joana. E vice-versa. Neli Rosa, Norma Sueli da Costas, outras faces e vozes das comadres que dialogam com as Joanas e, também, são Joanas em determinados momentos. E assim, como numa roda viva, pra lembrar outra peça de Chico, as atrizes e o ator vão se revezando, durante a leitura dramática, em diversos personagens num ritmo alucinante mas que só se torna algaravia no momento em que o texto pede – o desenrolar é claro. É a dor e a ira da mulher deixada pelo amante, com dois filhos, para casar-se com a herdeira do homem mais rico do vilarejo.

Quase na metade do espetáculo virtual, fica ainda mais claro o toque da direção (que assim como amalgama e embaralha as falas das personagens pulando de uma a uma no elenco) também atua como um diretor de imagens, um verdadeiro switcher de TV, no momento do encontro entre Jasão e Joana. É inegável que a presença de apenas um ator na tela reforça o tom dramático e a atenção do espectador pelo desenrolar da trama. Outro drama, infelizmente, é que qualquer plataforma disponível para videoconferências não usa a velocidade necessária de memória para transmissão de dados – a menos que todos os participantes tivessem equipamentos com placas de vídeo de última geração para montar lives ao estilo de artista que contam que essa infraestrutura. Mas nada que tenha dispersado o elenco, cujo mérito foi manter-se no foco, no texto e, apesar de alguns sustos técnicos, dar continuidade e ritmo ao andamento da leitura dramatizada, com a entrada “em cena” da diretora-assistente Laura da Rosa.

Minutos finais foram de agradecimentos e avaliação da iniciativa

Ao final, o diretor André Arteche fez uma rodada de comentários, apresentando o elenco e extraindo as impressões da experiência. A coordenadora do DAP, Neli Rosa, 73 anos, brincou com a paciência do diretor: “André, obrigada, nenhum de nós aqui é ator ou atriz, ainda mais on-line. Então foi um prazer estar aqui e quero agradecer especial à Helena, coordenadora de Cultura do Sisejufe por trazer o teatro para as atividades do sindicato”.

Carla Nascimento, servidora do TRT, aponta que nos últimos anos percebe-se muito sofrimento no trabalho. “Eu considero, portanto, que o teatro é um ambiente em que conseguimos expressar as nossas dores e emoções mais profundas mas também as vitórias!”, disse Carla.

Amauri Pinheiro contou que foi um dos últimos a entrar no grupo – o que se deu por incentivo de Carla Nascimento. “No início eu pensei: isso não vai dar certo (risos). Depois fui vendo o pessoal indo numa boa”, brinca. “Eu acho que o pessoal do Judiciário tem uma grande oportunidade de fazer teatro. Agora no recesso vai ter um curso e, depois, certamente outra peça. É muito prazeroso fazer teatro. Nunca imaginei que eu interpretaria alguém. Uma coisa é viver, outra é falar da vida. Acho que atuar é uma experiência pela qual todos deviam passar. Imagina, temos cerca de 6 mil servidores, vá que algum se destaque e saia profissional?! A simples participação é muito confortante para quem faz e espero que tenha sido também para quem assistiu”, concluiu um leve e sorridente Amauri/Mestre Egeu.

A diretora-assistente Laura da Rosa lembrou que o processo se deu uma maneira coletiva desde início, com todos buscando um caminho, um entendimento. “Todos trouxeram propostas e ideias e foi muito gratificante ver o empenho desse grupo. E, como estudante de teatro, ver o pessoal do Sisejufe honrando dessa forma uma peça tão incrível quanto essa do Chico Buarque é muito bonito de se ver”, elogia Laura. A servidora Luiza D’Alessandri fez questão de convidar a todos para participar do grupo: “No recesso vai ter curso, vale a pena participar”.

De acordo com Mara Paparella o curso e a encenação via internet, “foi um presente”. “Quando a gente faz a leitura dramatizada, a gente não é nem espectador nem ator. Estamos entre um e outro. E há uma coisa muita intensa que só quem vivencia vai entender: eu sempre li muito, mas a cada vez que você relê, o texto fica totalmente diferente. Você entra na personagem, vai entendendo aquela motivação e se apropriando da personagem… ou a personagem se apropria de você. É muito interessante”, revela Mara.

Norma Sueli da Costa agradeceu a oportunidade ao Departamento de Cultura do Sisejufe e lembrou que não é apenas o curso de teatro que está em andamento: “Temos também o coral e outras atividades culturais. Então isso é muito bom para agregar os servidores e servidoras públicas – porque nós trabalhamos muuito! E tem gente que acha que estamos no Judiciário para fazer crochê. Portanto o Departamento Cultural nos ajuda muito assim como ajuda o pessoal do DAP, que são os nossos aposentados – a gente não fica de fora”.

O diretor André Arteche reforça que, durante o curso, se vivenciou realmente o processo de preparação profissional de atores, com aquecimento de voz, descoberta de personagens etc. “Vida longa às pessoas que olham para a arte, para o trabalho do teatro, com a cabeça aberta como o pessoal do Sisejufe olha. Imagina como não seria se outros também fossem assim?”, diz Arteche.

No dia 24 de novembro haverá nova apresentação on-line da peça “Joanas”. E a partir de janeiro, começa o curso de teatro de verão com um apanhado de peças de Chico Buarque como “Gota d’Água”, “Calabar”, “Roda Viva” e “Saltimbancos”.

*Henri Figueiredo/Especial para o Sisejufe

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