Este artigo é de inteira responsabilidade do autor, não sendo esta necessariamente a opinião da diretoria da Fenajufe
Reforma política é sempre um tema complexo e polêmico porque envolve aspectos eleitorais e partidários, que afetam o desempenho e até a sobrevivência dos partidos políticos. A experiência tem demonstrado que matérias com esse grau de complexidade só mudam com generosas regras de transição e muito debate e negociação. Trata-se, portanto, de um debate recorrente na agenda política brasileira.
Para se ter uma idéia da amplitude e complexidade da matéria, basta dizer que a Lei dos Partidos Políticos, Lei 9.096, de 19 de setembro de 1997, só foi aprovada porque o artigo que instituiu a cláusula de barreira (exigência de 5% do eleitorado nacional, sendo 2% em pelo menos nove unidades da federação) como condição para que um partido pudesse ter funcionamento parlamentar só entraria em vigor 11 anos após, na eleição de 2006.
Esse artigo da lei poderá nem entrar em vigor pela natural resistência dos pequenos partidos, que já conseguiram eliminá-lo na proposta de reforma política em debate no Congresso. A regra realmente é muito dura. Um partido sem funcionamento parlamentar, mesmo com representantes eleitos na Câmara dos Deputados, não teria acesso aos recursos do fundo partidário, ao horário eleitoral gratuito, à participação na direção da Casa e das Comissões, entre outras prerrogativas indispensáveis a disseminação da doutrina e até à sobrevivência dessas agremiações.
A reforma política em debate na Câmara – especialmente o substitutivo do relator da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, deputado Rubens Otoni (PT/GO), cujos pontos centrais resumiremos a seguir – propõe importantes mudanças na legislação eleitoral e partidária (Código Eleitoral, Lei 4.737, de 1965; Lei dos Partidos Políticos, Lei 9.096, de 19/09/1995, e Lei Eleitoral, nº 9.504, de 30 de setembro de 1997) que só entrarão em vigor em 2006 se forem aprovadas nas duas casas do Congresso (Câmara e Senado) e transformadas em lei até lº de outubro de 2005, um ano antes da eleição, conforme determina o artigo 16 da Constituição Federal.
No Código Eleitoral não há maiores polêmicas, já que as mudanças se resumem a meras adequações às inovações nas leis eleitorais e partidárias, como: i) a revogação dos artigos sobre coligação nas eleições proporcionais, ii) a nova forma de distribuição das vagas por partido, que inclui aqueles que não atingiram o quociente eleitoral na disputa pelas vagas distribuídas pelo sistema de sobras, iii) a revisão da definição de suplente por força da alteração da adoção da lista partidária fechada, e iv) a eliminação do critério de empate entre candidatos, já que o novo sistema não se vota em candidato, mas em lista partidária.
Na Lei dos Partidos Políticos já começam as mudanças com maior profundidade que terão reflexo na vida dos partidos. Entre os temas mais relevantes estão: a) a criação da figura da federação partidária, como alternativa às coligações; b) a revogação do artigo 13 da Lei 9.096/95, que trata das exigências para o funcionamento partidário; c) a distribuição de 99% dos recursos do fundo partidário somente aos partidos que, na última eleição para a Câmara dos Deputados, tenham eleito deputados em pelo menos cinco estados e obtido no mínimo dois por cento dos votos apurados, excluídos brancos e nulos; e d) a destinação de 40 minutos por semestre no horário eleitoral gratuito, para inserções de trinta segundos ou um minuto, apenas para os partidos que, na última eleição para a Câmara dos Deputados, tenham eleito deputados em pelo menos cinco estados e obtido no mínimo dois por cento dos votos apurados, excluídos brancos e nulos.
É na Lei Eleitoral, entretanto, que estão os pontos centrais da reforma, ente os quais: 1) a substituição do voto no candidato pelo voto na lista partidária, cuja ordem dos candidatos será definida em convenção sem possibilidade de alteração pelo eleitor; 2) adoção do financiamento de campanha exclusivamente público; 3) a proibição de shows musicais ou espetáculos nos comícios; 4) assegura aos atuais deputados, com prioridade para os eleitos pelo partido pelo qual concorre à reeleição, a ocupação dos primeiros lugares na lista, na ordem decrescente de votos.
A adoção da lista fechada e bloqueada, com a pré-ordenação dos nomes pelo partido, é a mudança mais radical de toda a reforma, porque o mandato passa a ser do partido e não mais do parlamentar. A indicação da ordem dos candidatos na lista partidária será feita pela convenção, mediante a inscrição de chapa única ou de mais de uma chapa com nomes pré-ordenados, sendo estas subscritas por pelos menos cinco por cento dos filiados. Na hipótese de mais de uma chapa, o primeiro colocado na lista partidária será da chapa mais votada e os demais lugares serão preenchidos pelo critério da maior média das chapas apresentadas.
Como forma de amenizar a resistência na Câmara, a lei prevê que no pleito de 2006 serão assegurados aos atuais deputados os primeiros lugares na lista dos partidos ou federações, na ordem decrescente dos votos obtidos nas eleições de 2002. Os deputados que concorrerem à reeleição pelo mesmo partido pelo qual foram eleitos terão prioridade em relação aos que foram eleitos por outra legenda e mudaram de partido no curso do mandato.
O financiamento exclusivamente público de campanha, uma medida que visa a dar maior equidade à disputa eleitoral e evitar abuso de poder econômico, também encontra resistência, tanto de setores do governo quanto de alguns partidos políticos. A preocupação da equipe econômica do governo é com o volume de recursos que deverá ser destinado às campanhas eleitorais a cada dois anos, na razão de R$ 7,00 por cada eleitor, num valor estimado de R$ l bilhão de reais por eleição. A preocupação dos partidos em geral é com o risco de burla da lei e, especificamente, no caso do PL e PTB, que praticamente dobraram suas bancadas, a possibilidade de perda de recursos do financiamento de campanha. A regra de distribuição dos recursos para o financiamento das campanhas irá considerar o número de votos obtidos na última eleição, favorecendo, portanto, financeiramente os partidos que perderam parlamentar e, não os que ampliaram suas bancadas com o troca-troca partidário.
A proibição do show musical na campanha eleitoral, permitindo apenas por ocasião das convenções, é uma medida pedagógica, porque os votos devem ser conquistados a partir das propostas, idéias e programas dos partidos e não por intermédio de entretenimento e festas para os eleitores.
As mudanças, como se vê, são amplas e razoavelmente realistas. Entretanto, suas chances de aprovação, sem regras de transição alongadas, são reduzidas. Temas como o financiamento público de campanha, a adoção da lista partidária e o fim das coligações nas eleições proporcionais dificilmente serão aprovados para vigorar já em 2006.
* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e Diretor de Documentação do DIAP – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar. Atualmente, é assessor parlamentar da Fenajufe.
Por Antônio Augusto de Queiroz * – 13/02/05
Reforma política é sempre um tema complexo e polêmico porque envolve aspectos eleitorais e partidários, que afetam o desempenho e até a sobrevivência dos partidos políticos. A experiência tem demonstrado que matérias com esse grau de complexidade só mudam com generosas regras de transição e muito debate e negociação. Trata-se, portanto, de um debate recorrente na agenda política brasileira.
Para se ter uma idéia da amplitude e complexidade da matéria, basta dizer que a Lei dos Partidos Políticos, Lei 9.096, de 19 de setembro de 1997, só foi aprovada porque o artigo que instituiu a cláusula de barreira (exigência de 5% do eleitorado nacional, sendo 2% em pelo menos nove unidades da federação) como condição para que um partido pudesse ter funcionamento parlamentar só entraria em vigor 11 anos após, na eleição de 2006.
Esse artigo da lei poderá nem entrar em vigor pela natural resistência dos pequenos partidos, que já conseguiram eliminá-lo na proposta de reforma política em debate no Congresso. A regra realmente é muito dura. Um partido sem funcionamento parlamentar, mesmo com representantes eleitos na Câmara dos Deputados, não teria acesso aos recursos do fundo partidário, ao horário eleitoral gratuito, à participação na direção da Casa e das Comissões, entre outras prerrogativas indispensáveis a disseminação da doutrina e até à sobrevivência dessas agremiações.
A reforma política em debate na Câmara – especialmente o substitutivo do relator da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, deputado Rubens Otoni (PT/GO), cujos pontos centrais resumiremos a seguir – propõe importantes mudanças na legislação eleitoral e partidária (Código Eleitoral, Lei 4.737, de 1965; Lei dos Partidos Políticos, Lei 9.096, de 19/09/1995, e Lei Eleitoral, nº 9.504, de 30 de setembro de 1997) que só entrarão em vigor em 2006 se forem aprovadas nas duas casas do Congresso (Câmara e Senado) e transformadas em lei até lº de outubro de 2005, um ano antes da eleição, conforme determina o artigo 16 da Constituição Federal.
No Código Eleitoral não há maiores polêmicas, já que as mudanças se resumem a meras adequações às inovações nas leis eleitorais e partidárias, como: i) a revogação dos artigos sobre coligação nas eleições proporcionais, ii) a nova forma de distribuição das vagas por partido, que inclui aqueles que não atingiram o quociente eleitoral na disputa pelas vagas distribuídas pelo sistema de sobras, iii) a revisão da definição de suplente por força da alteração da adoção da lista partidária fechada, e iv) a eliminação do critério de empate entre candidatos, já que o novo sistema não se vota em candidato, mas em lista partidária.
Na Lei dos Partidos Políticos já começam as mudanças com maior profundidade que terão reflexo na vida dos partidos. Entre os temas mais relevantes estão: a) a criação da figura da federação partidária, como alternativa às coligações; b) a revogação do artigo 13 da Lei 9.096/95, que trata das exigências para o funcionamento partidário; c) a distribuição de 99% dos recursos do fundo partidário somente aos partidos que, na última eleição para a Câmara dos Deputados, tenham eleito deputados em pelo menos cinco estados e obtido no mínimo dois por cento dos votos apurados, excluídos brancos e nulos; e d) a destinação de 40 minutos por semestre no horário eleitoral gratuito, para inserções de trinta segundos ou um minuto, apenas para os partidos que, na última eleição para a Câmara dos Deputados, tenham eleito deputados em pelo menos cinco estados e obtido no mínimo dois por cento dos votos apurados, excluídos brancos e nulos.
É na Lei Eleitoral, entretanto, que estão os pontos centrais da reforma, ente os quais: 1) a substituição do voto no candidato pelo voto na lista partidária, cuja ordem dos candidatos será definida em convenção sem possibilidade de alteração pelo eleitor; 2) adoção do financiamento de campanha exclusivamente público; 3) a proibição de shows musicais ou espetáculos nos comícios; 4) assegura aos atuais deputados, com prioridade para os eleitos pelo partido pelo qual concorre à reeleição, a ocupação dos primeiros lugares na lista, na ordem decrescente de votos.
A adoção da lista fechada e bloqueada, com a pré-ordenação dos nomes pelo partido, é a mudança mais radical de toda a reforma, porque o mandato passa a ser do partido e não mais do parlamentar. A indicação da ordem dos candidatos na lista partidária será feita pela convenção, mediante a inscrição de chapa única ou de mais de uma chapa com nomes pré-ordenados, sendo estas subscritas por pelos menos cinco por cento dos filiados. Na hipótese de mais de uma chapa, o primeiro colocado na lista partidária será da chapa mais votada e os demais lugares serão preenchidos pelo critério da maior média das chapas apresentadas.
Como forma de amenizar a resistência na Câmara, a lei prevê que no pleito de 2006 serão assegurados aos atuais deputados os primeiros lugares na lista dos partidos ou federações, na ordem decrescente dos votos obtidos nas eleições de 2002. Os deputados que concorrerem à reeleição pelo mesmo partido pelo qual foram eleitos terão prioridade em relação aos que foram eleitos por outra legenda e mudaram de partido no curso do mandato.
O financiamento exclusivamente público de campanha, uma medida que visa a dar maior equidade à disputa eleitoral e evitar abuso de poder econômico, também encontra resistência, tanto de setores do governo quanto de alguns partidos políticos. A preocupação da equipe econômica do governo é com o volume de recursos que deverá ser destinado às campanhas eleitorais a cada dois anos, na razão de R$ 7,00 por cada eleitor, num valor estimado de R$ l bilhão de reais por eleição. A preocupação dos partidos em geral é com o risco de burla da lei e, especificamente, no caso do PL e PTB, que praticamente dobraram suas bancadas, a possibilidade de perda de recursos do financiamento de campanha. A regra de distribuição dos recursos para o financiamento das campanhas irá considerar o número de votos obtidos na última eleição, favorecendo, portanto, financeiramente os partidos que perderam parlamentar e, não os que ampliaram suas bancadas com o troca-troca partidário.
A proibição do show musical na campanha eleitoral, permitindo apenas por ocasião das convenções, é uma medida pedagógica, porque os votos devem ser conquistados a partir das propostas, idéias e programas dos partidos e não por intermédio de entretenimento e festas para os eleitores.
As mudanças, como se vê, são amplas e razoavelmente realistas. Entretanto, suas chances de aprovação, sem regras de transição alongadas, são reduzidas. Temas como o financiamento público de campanha, a adoção da lista partidária e o fim das coligações nas eleições proporcionais dificilmente serão aprovados para vigorar já em 2006.
* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e Diretor de Documentação do DIAP – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar. Atualmente, é assessor parlamentar da Fenajufe.