Este artigo é de inteira responsabilidade do autor, não sendo esta necessariamente a opinião da diretoria da Fenajufe
O servidor do poder judiciário encontra-se diante de um sério dilema:
De um lado, percebe que, mesmo depois do enorme esforço de passar por um exaustivo processo de concurso público, a carreira conquistada não lhe oferece perspectivas, demandando urgentemente grande esforço para conquistar sua reestruturação.
Há muitos técnicos experientes, em desvio de função, desempenhando o trabalho que deveria ser realizado pelos analistas, não sendo todavia remunerados como tal. Da mesma forma, há muitos analistas atuando em tarefas bem abaixo do seu potencial, em flagrante desperdício de recursos públicos.
Não há alternativa interna de qualificação capaz de produzir progressão efetiva para os analistas nem para os técnicos com nível superior. A ascensão na carreira está totalmente despida de critérios claros e objetivos e depende cada vez mais de mecanismos perniciosos como “pistolões” e trocas de favores. Em decorrência disso, o trabalho é ineficiente, o ambiente é desestimulante e muita energia é desperdiçada.
De outro lado, a política de erosão salarial e retirada de direitos, impingida ao servidor público nos últimos 20 anos, fragiliza sua coragem, levando-o à premência de proteger-se pela prestação excessiva de horas extras e o apelo aos falsos planos de cargos e salários cuja única intenção e utilidade tem sido a obtenção de redução parcial das perdas inflacionárias, sendo totalmente inefetivos para impedir a perda constante de direitos.
Embora seja praticamente unânime a necessidade de reestruturação da carreira, a urgência econômica o tem levado a concentrar suas forças em lutar por reajustes que nem sequer resolvem seus problemas, ao contrário, os agravam.
Para piorar, o longo desse período, devido à perda de direitos, diferenciaram-se na categoria diversos grupos, com interesses muitas vezes antagônicos.
Há servidores com direito a aposentadoria integral e paridade, há outros com aposentadoria quase integral e sem paridade e há ainda servidores com aposentadoria limitada ao teto do INSS.
Sob outro prisma, há aqueles que, por estar protegidos por direitos legitimamente adquiridos durante a vigência de legislação já revogada, tiveram a sorte de ver incorporadas a seus vencimentos vantagens pessoais tais como quinquênios e etc.
Em contraste, há os mais novos, que por estarem vinculados à legislação posterior, por mais dedicados e esforçados que sejam, jamais incorporarão em seus vencimentos as gratificações que recebem, fazendo com o acréscimo recebido tenha sempre caráter precário, sujeitando-os a toda sorte de ameaças e chantagens.
Todos eles convivem no mesmo ambiente, realizando as mesmas tarefas, muitas vezes lado a lado.
Será possível alinhar interesses tão díspares ao ponto de construir uma agenda consensual?
Propõe-se aqui um exercício, uma via lúdica, divertida e não conflituosa para resolver esse dilema, baseada na Teoria dos Jogos (imortalizada por Russel Crowe ao representar John Nash em “Uma Mente Brilhante”).
O primeiro passo é identificar cada um desses grupos e seus interesses. Cada grupo desses terá um representante, que será chamado de jogador, que terá a missão de defender os interesses de sua classe respeitosamente, abertamente, sem hipocrisias, dissimulações nem paixões.
A cada rodada o jogador buscará antecipar os movimentos que os demais jogadores farão em resposta aos seus. Por fim, após algumas rodadas, numa espiral dialética, identifica-se quais os possíveis equilíbrios alcançados.
Vamos lá.
Lembrando que é um jogo em 2 tabuleiros, essa é a posição inicial das peças:
O primeiro tabuleiro é o da CARREIRA. Tem 7 jogadores e foram identificadas inicialmente 8 posicionamentos (embora muitos mais possam ainda surgir dos grupos de trabalho de discussão de carreira):
TABULEIRO 1 – CARREIRA |
Técnicos nível médio |
Técnicos Nivel Superior |
Analistas |
Analistas Subutiliz. |
Agentes de Segur. |
Oficiais |
Governo (Judiciário) |
Regras para (FC/CJ) baseadas em qualificação |
não convém |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
aceitável |
Regras para (FC/CJ) baseadas em cargo |
não convém |
não convém |
a favor |
a favor |
não convém |
não convém |
aceitável |
Regras objetivas para descrição de cargos |
não convém |
não convém |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
não convém |
Critérios objetivos de remoção e distribuição |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
não convém |
Manter a GAE como diferencial |
não convém |
não convém |
não convém |
não convém |
não convém |
a favor |
não convém |
Manter a GAS como diferencial |
não convém |
não convém |
não convém |
não convém |
a favor |
não convém |
não convém |
Transformação em carreira única |
a favor |
a favor |
não convém |
não convém |
não convém |
não convém |
aceitável |
Participação na elaboração de metas |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
a favor |
aceitável |
Desse primeiro tabuleiro, abstrai-se que:
A reestruturação da carreira é um tema complexo cuja solução será dada pelas diferenças de poder de pressão de cada um dos jogadores;
Os critérios objetivos de remoção e substituição são um objetivo de toda a categoria, sendo que a oposição do judiciário tem caráter ilegal e questionável, podendo e merecendo ser enfrentada;
As regras para FC/CJ baseadas em qualificação tem muito pouca resistência na categoria e eventual oposição do Judiciário é igualmente injustificável;
A criação de regras objetivas para descrição dos cargos, eliminando os desvios de função tem apoio considerável, podendo evoluir para uma solução que contemple a todos os jogadores;
A participação na elaboração das metas do CNJ é algo que interessa a todos.
Já o segundo tabuleiro é o de REMUNERAÇÃO. Tem 6 jogadores e 5 modelos remuneratórios:
TABULEIRO 2 – REMUNERAÇÃO |
Aposentadoria Integral |
Apos. Integ. e incorp. |
Apos Prop |
Apos Prop e Incorp |
Apos. Limitada ao teto INSS |
Governo (Executivo) |
Reajuste via VB |
aceitável |
preferível |
aceitável |
preferível |
aceitável |
não convém |
Reajuste via GAJ |
aceitável |
aceitável |
aceitável |
aceitável |
aceitável |
aceitável |
Reajuste via Gratif. Desempenho |
não convém |
não convém |
não convém |
não convém |
preferível |
preferível |
Subsídio com subteto |
preferível |
não convém |
aceitável |
não convém |
aceitável |
aceitável |
Subsídio com teto constitucional |
preferível |
preferível |
preferível |
preferível |
aceitável |
aceitável |
Dessa tabela, depreende-se que:
O reajuste via VB, que embora seja aceitável para toda a categoria, não convém ao executivo por diversos motivos, entre eles, trazer incerteza quanto ao custo real da folha;
O reajuste pela GAJ, que é aceitável a todos os jogadores;
O reajuste via GD, que não convém a ninguém, exceto ao governo e aos mais novos;
O reajuste via Subsídio, respeitando o teto constitucional, que é o mais palatável a todos os jogadores.
Por isso, concluindo, é evidente que a remuneração por subsídio, se devidamente negociada, pode ser o Equilíbrio de Nash desse jogo.
O que você acha?