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Ameaça a direitos e de regressão institucional impactam sucessão à Presidência

Sindicatos

Movimento amplo surge em resposta a propostas e ideias representadas por Bolsonaro; protestos no próximo dia 29 serão realizados por categorias, artistas, movimentos, lideranças religiosas e até torcidas organizadas; diretoria do Sintrajud convoca o ato em SP em defesa dos direitos

 

Sintrajud (SP)

Vários analistas e cientistas políticos avaliam que a eleição presidencial mais polarizada desde a redemocratização deve ser, mais uma vez, decidida pelas mulheres. A poucos dias da votação, mais da metade das eleitoras declararam ainda não ter optado por uma candidatura à pesquisa Datafolha divulgada no último dia 20. São quase 40 milhões de brasileiras, cerca de 27% do eleitorado. O jornal ‘O Globo’ solicitou ao instituto o perfil socioeconômico dessas mulheres: 45,3% moram no Sudeste e 54% ganham até dois salários mínimos por mês.

O levantamento do Ibope divulgado nesta segunda, 24, mantém o cenário. Perguntadas em quem votariam se a eleição presidencial fosse hoje, 46% das entrevistadas declararam não ter opção definida. Essa é a soma das intenções de voto branco, nulo e das mulheres que responderam não saber ou simplesmente se negaram declarar.

A socióloga e especialista em pesquisas Fátima Pacheco Jordão explica que, tradicionalmente, as mulheres demoram mais a definir o voto porque as pautas de interesse são menos abordadas, e elas são mais críticas e desconfiadas das promessas que circulam nestes períodos. “As mulheres fazem maior escrutínio do processo, deixando mais para o final a decisão”, aponta.

Além do peso das mulheres, uma parcela significativa do eleitorado declara que ainda pode mudar o voto nesta reta final. “Há dois tipos de indecisos, os que declaram candidaturas mas admitem que ainda podem mudar o voto e os que ainda não sabem dizer em quem votar ou declaram que vão anular. Somados, são quase 40%. Desta parcela, 7 em cada 10 são mulheres. Provavelmente os chamados indecisos devem chegar às vésperas da eleição entre 20% e 30%, quando tradicionalmente o patamar é de 20%”, explica Fátima Jordão.

Para o candidato à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro, a notícia não é nada boa. Foram as mulheres que inauguraram um movimento de freio ao crescimento do presidenciável que assumiu a dianteira nas pesquisas eleitorais em meio à crise nacional. O grupo de Facebook ‘Mulheres unidas contra Bolsonaro’ atingiu 2,5 milhões de participantes em menos de três dias, e chegou a ser hackeado por apoiadores do presidenciável. As administradoras foram excluídas e denunciaram ameaças, por duas vezes a conta foi recuperada e atacada novamente, até que foi possível retomar a página que agora reúne 3,3 milhões de participantes.

A mobilização cresceu ainda mais. Diversos outros grupos similares foram criados por indígenas, quilombolas e outros movimentos antirracistas, judeus, homens, evangélicos, cristãos, categorias, artistas, movimentos sociais e até torcidas organizadas. Todos convocam para o próximo sábado (29 de setembro) atos em centenas de cidades brasileiras. Já estão também marcados protestos em 12 países. Em São Paulo, a manifestação suprapartidária terá início às 17 horas, no Largo da Batata (Zona Oeste).

Diante do impacto dos atos, o candidato iniciou a divulgação em mensagens via Twitter do que chamou de um ‘Manifesto à Nação’. A agência de notícias ‘Estadão Conteúdo’ havia destacado dias antes que o texto abordará a defesa da democracia, tentará desassociá-lo das marcas de racismo e misoginia, e afirmará compromisso com o ajuste fiscal.

Ameaças de regressão institucional

A centralidade que o candidato com apoio de 28% do eleitorado, cerca de 41 milhões de eleitores, ganhou na sucessão presidencial não é fruto somente de sua dianteira ou do atentado que sofreu durante um comício na cidade mineira de Juiz de Fora.

O incidente foi repudiado por todas as demais candidaturas e diversas entidades, entre elas o Sintrajud. Mas o que tomou o debate público nacional e internacional nos últimos dias é a agenda representada por Bolsonaro. A vitória do ex-capitão do Exército já assustava uma parcela dos cidadãos que temem violações de direitos. Em diversas oportunidades ele elogiou o ex-coronel reconhecido como um dos chefes do aparato de tortura do regime ditatorial de 1964-1985, Carlos Alberto Brilhante Ustra. Também por reiteradas vezes avalizou a prática do suplício – que é crime contra a humanidade. Além de suas históricas e atuais falas racistas, xenófobas, machistas e LGBTfóbicas.

Na noite da última terça-feira, 25, um de seus filhos publicou uma foto em suas redes sociais simulando a tortura de uma pessoa a quem associou, por meio de texto sobreposto à imagem, ao movimento #EleNão [hashtag que mobiliza para as manifestações do próximo sábado]. Optamos por não reproduzir a montagem dada sua brutalidade, mas na internet e em todos os veículos de mídia foi divulgada a reprodução da foto de um rapaz ensanguentado com um saco plástico à cabeça e amarrado por fios, legendada com #EleNão seguido da referência homofóbica “sobre pais que choram no chuveiro”. Após a repercussão, Carlos Bolsonaro, que é vereador no Rio de Janeiro, alegou ter sido mera “brincadeira” a reprodução de uma imagem cuja origem é outra conta virtual.

Declarações recentes do candidato e do general da reserva que ocupa o posto de vice na chapa do presidenciável ampliaram o temor de uma repetição da história brasileira de ditaduras. Diversos setores sociais, pesquisadores e mesmo grupos de mídia que impulsionaram o crescimento da candidatura agora apontam as reiteradas ameaças de ruptura institucional que o capitão representa.

Bolsonaro já afirmou que “estuda” ampliar para 21 o número de membros do Supremo Tribunal Federal – o que lhe daria o poder de nomeação de, no mínimo, 10 ministros. A medida viola a cláusula pétrea de separação dos poderes da República, na avaliação de juristas. E ainda traz o efeito colateral de aumentar drasticamente o volume do orçamento que vai para o auxílio moradia.

Hamilton Mourão, o vice, defendeu alterações constitucionais por um “conselho de notáveis escolhido pelo presidente” e “autogolpe militar em caso de anarquia”.

Nesta segunda-feira (24) foi lançado o manifesto ‘Democracia sim’, que reúne cerca de 400 intelectuais, artistas e personalidades das mais diversas colorações ideológicas contra a agenda bolsonarista.

Aumento do IR, desresgulamentação trabalhista, reforma da Previdência relâmpago

A revista norte-americana ‘The Economist’ – insuspeita de esquerdismo – dedicou a capa da edição de setembro ao candidato. Para a publicação, Bolsonaro representa “a mais recente ameaça da América Latina”. A reportagem afirma ainda que o capitão “populista de direita” seria “um presidente desastroso” que colocaria o país em risco de piorar ainda mais a situação de “desastre econômico”, “compressão das finanças públicas” e “podridão política”.

Pelo lado oposto, o editor-chefe de outra revista estadunidense voltada ao mercado, a ‘Americas Quarterly’, publicou avaliação que aponta para os trabalhadores a mesma ameaça. Em artigo na ‘Folha de S. Paulo’, Brian Winter afirma que uma parte dos investidores internacionais torcem pelo ex-capitão por sua defesa da “ortodoxia”, da “reforma das aposentadorias” e pela “possibilidade do Cálice Sagrado de Wall Street – a privatização da Petrobras”.

O candidato já defendeu também instituir contratos de trabalho sob as regras pós-reforma trabalhista e por meio de contratos fora até mesmo dos limitados marcos legais colocados pela Lei 13.467/2017.

O guru do presidenciável, Paulo Guedes apresentou como agenda econômica criar um imposto sobre operações financeiras e outro sobre valor agregado, além de aumentar a alíquota do IRPF das faixas de menor renda, a maioria da população, para reduzir a tributação de quem ganha mais e rentistas, unificando a alíquota 20%. Diante de críticas inclusive do empresariado, o candidato chegou a desautorizar o economista-chefe da campanha. No último domingo, Guedes afirmou em reunião com investidores que, se eleito, Bolsonaro pretende ajudar o governo Temer a aprovar a reforma da Previdência ainda neste ano.

“Evidentemente respeitamos as opções eleitorais e partidárias das pessoas, mas é nosso dever alertar e denunciar todos aqueles que ameaçam ou atacam nossos interesses e direitos dos trabalhadores. O Bolsonaro não só é portador de pautas absolutamente retrógradas, também é agente de uma agenda regressiva em termos de política, economia e direitos sociais. Ajuste fiscal, reforma da Previdência, votou a favor da emenda 95”, aponta o diretor do Sintrajud e servidor do TRT-2 Tarcisio Ferreira.

O presidenciável também foi denunciado por receber o auxílio-moradia parlamentar tendo imóvel em Brasília, por contratar funcionária fantasma e por ter recebido R$ 200 mil que admitiu serem propina da JBS ao seu antigo partido, o PP de Paulo Maluf.

Defesa de direitos

“Vivemos em tempos muito difíceis no país, a gente não pode concordar com um candidato machista, racista, que não respeita a maior dádiva que uma mulher pode ter, que é ser mãe, e por isso defende que elas têm que receber menos que os homens. Um candidato que hierarquiza vidas e secundariza a condição de vida das mulheres. Tudo o que ele prega é um retrocesso para o país, e é inaceitável que nós mulheres nos submetamos a isso. Por isso, #EleNão”, afirma Claudia Vilapiano, dirigente do Sindicato e servidora da JF/Campinas.

“Estamos enfrentando um monstro de várias cabeças, Bolsonaro é uma delas. As outras também precisam ser cortadas. Nos preocupa que o #EleNão seja interpretado como “qualquer outro, tudo bem”. Até porque sabemos que a partir de 1º de janeiro ataques ao funcionalismo e ao conjunto dos trabalhadores virão. Aliás, é importante lembrar que mesmo as forças de centro contribuíram com o fortalecimento dessa polarização. O PSDB e o PT – que, por exemplo, foi conivente com a eleição do pastor Marco Feliciano à  Comissão de Direitos Humanos da Câmara. E na medida em que fragilizaram as pautas mais avançadas em decorrência da política de alianças que fizeram, deram espaço para o crescimento dos setores mais conservadores”, destaca Tarcisio Ferreira.

Neste contexto, a direção do Sintrajud decidiu somar-se à convocatória do ato em resposta a esse conjunto de posicionamentos. E também em respeito à pesquisa realizada pelo Sindicato em abril deste ano, à qual 7 em cada 10 servidores responderam que preferem a democracia a qualquer outra forma de governo. À época, 10% dos servidores manifestavam intenção de voto em Bolsonaro. No conjunto da sociedade o índice era de 15%.

No mesmo dia o Sindicato realiza duas atividades que já estavam convocadas: o minicurso Teoria Crítica do Direito e o debate sobre o julgamento da criminalização do aborto no Supremo Tribunal Federal. Mas após os eventos a orientação é que todos participem do ato. “Poderemos participar do ato, tranquilamente! Temos obrigação de participarmos enquanto mulheres, de nos opormos a esse discurso machista, racista e homofóbico. E o sindicato chama as mulheres da categoria também para se opor à agenda que ele representa”, ressalta a também diretora do Sintrajud Luciana Carneiro, servidora do TRF.